No comboio, Lisboa começa a desfocar-se...



escrito há muito tempo...

Lisboa começa a desfocar-se... estou no comboio rumo ao Norte. A Mariana -  muleta da minha vida desde os seis anos, altura em que as nossas mochilas se conheceram, ali alinhadas à espera do sinal da campaínha que a Dona Adelina, funcionária da escola, fazia tocar todos os dias às nove da manhã -  contou-me que mais do que ser uma mulher do Norte, eu e ela somos mulheres do Minho e que isto tinha tudo a ver com a quantidade de sangue na guelra. 

Neste comboio o rumo do meu sangue é mesmo Barcelos, mas as minhas memórias são do Porto.

Lembro-me das noites do Porto, da queima das fitas, das festas na Vogue e no Via Rápida...  do curso de Psicologia e dos almoços na cantina de Medicina Dentária, das tardes passadas a passear em Cedofeita ao pé da Faculdade de Direito e de Farmácia. Namorei com um rapaz que vivia nessa rua, por cima da Parfois Outlet... mas devo dizer que tenho melhores recordações do dinheiro que gastei na Parfois do que dele! 

Adorava a minha casa que ficava a cinco minutos dali, ao pé do metro da Lapa, na Rua da Boavista. Vivia com a Juliana e, muitas vezes, descíamos a rua para comer um croissant no Califa. Se continuasse a descer chegava à Casa da Música onde apanhava o autocarro para a Foz, para a casa da Joaninha com quem fazia os trabalhos de curso. 
Ao pé da Casa da Música vivia a Filipa de Bragança. Éramos as três de Psicologia e fomos as três chamadas ao Gabinete da Professora de Técnicas de Avaliação Psicológica para receber uma ameaça:

- Uma de vocês tem de se acusar. Tiraram as três 17 valores no trabalho. Quero saber quem liderou este trabalho, que não era de grupo, era individual! Essa pessoa fica com 17 e as outras levam 14 valores.  

Depois de quinze minutos de tortura e sem acusações...

- Pronto, então eu escolho. Dou 17 valores à Joana e 14 às restantes.

Oi? Como é que é? E eu, que passsei as férias a ler Carl Rogers até ao tutano para conseguir fazer aquele trabalho, tinha de emagrecer o meu 17 para caber num 14? Se a Mariana diz que eu sou uma mulher do Minho, vamos lá resolver isto com a mão na anca e com um saco de trinta quilos de batatas na cabeça.

- Pode escrever o valor que quiser na sua pauta porque o que eu sei e aprendi está na minha cabeça e vale 17 valores. Podemos testar isso até. E agora se me dá licença! 

Fim do Totoloto. Acabamos com 16 valores na pauta e... 
17 na cabeça. 

Estou a rir-me sozinha no comboio. Ela tinha razão, nós tínhamos feito o trabalho em conjunto. 

O comboio segue e seguem-se as memórias... 

O desfile que fiz no Palácio Cristal...
 Lembro-me de São Bento, de continuar no metro e atravessar a ponte onde fui desfilar Visons à porta fechada no El Corte Inglês. 

 Qual Victoria Secret, qual quê? 
Eu só queria ser Miss Universidade do Porto e Miss Douro.

O Comboio parou! 

Estamos em Coimbra. Oh Coimbra.... No décimo segundo ano, o nosso grupo de amigas de Barcelos foi distribuído por Coimbra, Braga e Porto. 

- Olha que pena. Não vamos estudar juntas, mas vamos divertirmo-nos muito juntas! 

Apanhávamos o comboio para Coimbra para ir às latadas e às queimas, aos convívios de Direito e de Arquitectura. Arrependíamo-nos, depois de beber traçadinho, de ter escolhido Braga e Porto para estudar. Apaixonei-me muito por Coimbra. Apaixonei-me muito em Coimbra. 

Fim das queimas. 

Desaparecemos. 

- Vemo--nos no Verão na praia de Esposende! 
- Vamos ter contigo a Moledo!
- Combinámos com a Joaninha na praia da Mariana em Viana?
- S.Pedro em Vila do Conde, já sabem...
- Na praia da Azurara!?
- Podemos ir ao Hit na Póvoa?
- Quando abre o Forte em Vila do Conde?


Até lá temos dois meses de exames pela frente. 

Bora estudar!

Boa sorte, meninas!

Até breve!

Fui!








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